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sexta-feira, 28 de março de 2008

O Poeta Vidente

Por Luis de Morais Junior
Jean-Nicolas Arthur Rimbaud (conhecido como Arthur Rimbaud), nasceu em Charleville, na França, em 20 de outubro de 1854, e faleceu em 10 de novembro de 1891, em Marselha, também na França. É considerado um dos maiores poetas franceses e expoente do chamado simbolismo.
Arthur Rimbaud nasceu no seio da classe média provincial de Charleville no nordeste da França. Foi um garoto inquieto, impaciente, porém um aluno brilhante. Aos quinze anos ganhou muitos prêmios e compôs versos originais e diálogos em latim.
Rimbaud teve como mentor literário seu professor Georges Izambard, e seus versos em francês começaram a melhorar rapidamente depois disso. Foi influenciado também pelos franceses Victor Hugo, Charles Baudelaire, seu amigo pessoal Paul Verlaine, além do americano Walt Whitman.
Ele fugia freqüentemente de casa e uniu-se por pouco tempo à Comuna de Paris de 1871, que foi retratada em seu poema L’orgia Parisiense (“A orgia parisiense”). Acredita-se que pode ter sofrido violências sexuais por soldados bêbados da Comuna e seu poema Le Couer Supllicié (“Coração Torturado”) parece sugerir isso. Nesta época ele se tornou um anarquista, começou a beber e se divertia chocando a burguesia local com suas roupas velhas e rasgadas e com seu longo cabelo, que mantinha sempre desarrumado.
Neste mesmo tempo escreveu sua famosa carta para seu professor Izambard, chamada de Les Lettres du Voyart (“As Cartas do Vidente”), onde descreve seu método para atingir a transcendência poética ou o poder visionário através do “longo, imenso e sensato desregramento de todos os sentidos”.
Vai para Paris em 1871 por um convite do iminente poeta simbolista Paul Verlaine, que lhe apresenta as “rodas” intelectuais parisienses. Diz-se que Verlaine se apaixonou por Rimbaud a ponto de abandonar esposa e filho, e que os dois levaram uma vida ociosa, regada a absinto e haxixe, escandalizando o círculo literário de Paris por causa do comportamento ultrajante de Rimbaud, o arquétipo enfant terrible, que continuou escrevendo notáveis versos visionários. Sobre o envolvimento homossexual entre Rimbaud e Verlaine não se sabe se é ou não lenda, já que só existem registros do envolvimento de Rimbaud com mulheres, tendo sido casado com algumas. Já Verlaine era um notório bissexual.



Rimbaud teve um único livro publicado em vida, Une Saison En Enfern (“Uma Estação no Inferno”), escrito em 1872 e lançado em outubro de 1873, com dinheiro do próprio bolso. Escrito em prosa poética sob o manto metafórico do simbolismo é uma verdadeira obra-prima da literatura universal. Suas outras obras lançadas como “Les Lettres du Voyant” (Cartas do Vidente), “Iluminations” (Iluminações), além de poemas como “Bateau Ivre” (Barco Embriagado) e a “Vierge Folle” (Virgem Louca), foram organizados e lançados posteriormente e muitos dos seus escritos foram perdidos.
Por volta de 1875 Rimbaud acabou por desistir de escrever e resolveu trabalhar e tentar ficar rico. Alguns dizem que ele manteve vivo seu antigo estado selvagem, enquanto outros sugerem que ele pretendia ficar independente financeiramente para um dia viver como um poeta despreocupado e tranqüilo. De qualquer forma, ele viajou por toda Europa, até mesmo a pé, e morou por um tempo na África, onde foi mercador, negociando, entre outras coisas, armas de fogo.
Em 1891, retornou para falecer em Marselhas, vítima de um câncer que se espalha pelo seu corpo inteiro.
Arthur Rimbaud foi um fenômeno poético, um vidente absolutamente iluminado e um ícone da literatura francesa. Teve sua personalidade elevada a mito, transformando-se em bandeira do irracionalismo, da redescoberta do corpo e da busca da totalidade do ser humano.

O barco embriagado



Enquanto eu acompanhava rios impassíveis,
Não me senti mais guiado pelos rebocadores:
Índios aos berros os tomaram por alvo,
Pregando-os nus aos troncos de cores.

Não me preocupei com todas as equipagens,
Carregando trigo flamengo ou algodão inglês.
Quando com meus rebocadores acabou a gritaria,
Os rios me deixaram descer onde queria.

Através dos furiosos murmúrios das marés,
No outro inverno, mais surdo que mentes infantis,
Eu corri! E as penínsulas desgarradas
Nunca tiveram tão triunfais algazarras.

A tempestade abençoou meus despertares marinhos.
Mais leve que a rolha dancei sobre ondas
Que são para as vítimas eternos redemoinhos,
Dez noites, sem lamentar o olho tolo dos faróis!

Mais doce que às crianças a carne das maçãs,
Penetra a água verde meu casco de pinho
E das manchas de vômitos e do azulado vinho
Me lava, dispersando o leme e o arpão.

Desde então mergulhei no Verso
Do Mar, leitoso e de astros mesclado,
Devorando os azuis verdes; onde, lívido imerso
E arrebatado, desce um pensativo afogado;

Onde, tingindo num instante os azuis, delírios
E ritmos lentos no clarão dos dias,
Mais fortes que o álcool, mais vastas que as liras,
Fermentam do amor acres rubras melancolias!

Sei de céus que estalam em raios, de tormentas
Ressecas e correntes: sei da noite e do Alvorecer
Exaltado tal o revoar de miríades de pombas,
E vi certas vezes o que o homem acreditou ver!

Vi o sol poente, manchado de horrores místicos,
Iluminando longos coágulos violetas,
Como atores de dramas muito antigos
Ondas distantes rolando arrepios de frestas!

Sonhei a verde noite de neves deslumbrantes,
Beijo afluindo aos olhos dos mares lentamente,
A circulação de seivas espantosas,
E o despertar azul amarelo dos fósforos cantantes!

Vaguei, por meses, como gado histérico,
As ondas arrebatando os recifes,
Sem pensar que os luminosos pés das Marias
Pudessem cavalgar o Oceano asmático!

Atingi, como sabem, incríveis Flóridas
Mesclando às flores olhos de panteras
Com pele humana! Arcos-íris tensos qual rédeas
Sob o horizonte dos mares, em glaucos rebanhos!

Vi fermentar enormes pântanos, ardis
Onde entre os juncos um Leviatã apodrece!
Despencam águas em meio a calmarias,
E horizontes para os abismos descem!

Geleiras, sóis de prata, vagas de nácar, céus de brasa!
Encalhe odioso no fundo de golfos negrumes
Onde cobras gigantes devoradas por percevejos
Caem, de tortos ramos, com negros perfumes!

Queria mostrar às crianças estas douradas
Na onda azul, estes peixes dourados, estes peixes cantantes.
— Espumas de flores embalaram minhas fugas
E inefáveis ventos me alaram por instantes.

Às vezes, mártir cansado dos pólos e das zonas,
O mar cujo soluço adoçava meus vagueios
Me alçou suas flores de sombra de ventosas amarelas
E eu ficava, qual mulher de joelhos...


Quase ilha, balançando em minhas margens as brigas
E os excrementos de pássaros dos olhos loiros gritando.
E eu navegava, quando através de meus tênues laços
Afogados desciam dormir, recuando!

E eu, barco perdido sob os cabelos das angras,
Pelo furacão no éter sem pássaro lançado,
A quem os Monitores e os veleiros das Hansas
Não teriam a carcaça ébria de água resgatado;

Livre, fumando, alçado de brumas violetas,
Eu perfurava o céu rubro como o muro
Que traz confeito doce aos bons poetas,
Líquens de sol e escarros azulados;

Que corria, manchado de lúnulas elétricas,
Prancha louca, por hipocampos negros escoltado,
Quando julho desmoronava a bastonadas
Os céus ultramarinos ardentes fundados;

Eu que tremia, ouvindo gemer de cinqüenta léguas
O cio dos demônios e dos abismos estreitos,
Tecelão eterno das imobilidades azuis,
Lamento a Europa dos antigos parapeitos!

Vi arquipélagos siderais! e ilhas
Cujos céus delirantes se abrem ao vogar:
— É nestas noites sem fundo que dormes e te exilas,
Milhão de pássaros de ouro, ô futuro Vigor?

Mas, verdade, chorei muito! As auroras são magoantes.
Toda lua é atroz e todo sol, amargo:
O acre amor me inflou de torpezas embriagantes.
O que minha quilha estale! 0 que eu vá ao mar!

Se desejo uma água da Europa, é o charco
Negro e frio onde no crepúsculo perfumado
Cheio de tristeza um menino agachado
Como borboleta de maio solta o tênue barco.

Não posso mais, banhado por vossos langores, ô ondas,
Levar seus sulcos dos carregadores de algodões,
Nem atravessar o orgulho das bandeiras e das chamas,
Nem nadar sob os horríveis olhos dos pontões.

Tradução de Alberto Marsicano e Daniel Fresnot

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